Obsolescência (não) programada
No mundo da tecnologia, o último modelo, gadget ou processador é sempre melhor que o anterior. A ironia, ao que parece, é que algumas companhias desse segmento pensam da mesma forma no que diz respeito aos seres humanos. Nessa semana, a IBM virou alvo de uma ação coletiva num tribunal federal dos EUA por, supostamente, ter demitido colaboradores por causa da idade deles. Liderada por três ex-funcionários, que se dizem vítimas de discriminação, a ação é assinada pela advogada Shannon Liss-Riordan. A jurista é conhecida por já ter representado trabalhadores contra Amazon, Uber, Google e outras grandonas do mundo tech. Mas, ela volta já, já. Por agora, é preciso dizer que a ação tem base não só nos depoimentos dos ex-IBMs, como também em um relatório divulgado pela agência ProPublica, em março. O documento aponta que a companhia demitiu mais de 20 mil funcionários acima dos 40 anos, apenas nos últimos seis anos.
International Firing Machine
A gigante de TI é acusada, assim, de desligar o pessoal mais velho de maneira sistemática para rejuvenescer seu time. Veja só, depois de chegar atrasada no bonde da nuvem e da tecnologia móvel, a empresa sofreu o baque e precisou cortar milhares de pessoas, em um esforço para reduzir custos. Até aí, faz parte. A questão está no perfil dos colaboradores que foram desligados. Para dificultar, a International Business Machine deixou de publicar o número de funcionários demitidos e, até mesmo, o tamanho de sua força de trabalho atual.
Para entender o dano que a IBM pode sofrer com o processo, precisamos falar um pouco sobre a mente à frente da acusação. Um spoiler: ela não tem lá muito medo de peitar big guys do mercado.
Para entender o dano que a IBM pode sofrer com o processo, precisamos falar um pouco sobre a mente à frente da acusação. Um spoiler: ela não tem lá muito medo de peitar big guys do mercado.
Better Call Shannon
“Um pitbull com um chiuaua na boca”. É assim que os críticos descrevem a advogada Liss-Riordan. A ação mais famosa envolvendo a jurista foi um acordo de USD 100 milhões com a Uber, num processo que pedia que a ride-hailing reconhecesse os motoristas como seus empregados. Apesar da vitória inicial, a negociação foi bloqueada por um juiz federal dos EUA. Mas a “campeã dos trabalhadores” não desistiu e ainda processa de maneira individual os fundadores da companhia de transportes, Travis Kalanick e Garrett Camp.
Cortando cabeças (de mais idade)
Além de prejudicar a reputação da IBM, a ação pode atrair a atenção de outros ex-funcionários e virar uma verdadeira bola de neve. Em entrevistas, antigos colaboradores contam uma história tensa: as demissões criavam uma atmosfera de confusão e medo entre os mais velhos. Alguns tentavam pular de um time para outro, sempre em busca de uma posição menos ameaçada. Quem acabou dando adeus não saiu feliz com o acordo. É que, com a crise que pegou a empresa pelo cangote, a gigante tech passou a oferecer rescisões menos vantajosas do que as que concedia em seus anos dourados. A insatisfação com a grana foi tanta que teve gente que preferiu recusar o dinheiro e entrar com uma ação judicial.
Brave New World
Esse processo não vem sem contexto. Afinal de contas, o time pós-40 têm problemas para manter o crachá? É difícil cravar uma afirmação tão forte, principalmente, porque os relatórios de diversidade de várias das big tech não contam com informações sobre a faixa etária. Mas há indícios de que sim. No Google, por exemplo, há um grupo chamado de Greyglers, que representa cerca de 2 mil pessoas. Só como medida de comparação, antes de se reorganizar como a holding Alphabet, em 2015, o buscador contava com mais 57 mil funcionários.
Stay fresh?
Um estudo feito pela plataforma de análises Visier, em 2017 entrevistou 63 mil trabalhadores da indústria de tecnologia e 267 mil colaboradores de outros setores e concluiu que é mais difícil para os ~hardwares humanos mais velhos~ arrumarem emprego, no geral. Indo, especificamente, para a bolha tech, a média de idade entre os devs nos EUA é de 31 anos, contra 28 anos no resto do mundo. Em sete das 18 principais marcas do Vale, o indicador é de 30 anos ou menos, segundo um levantamento da PayScale. O curioso da história é que estamos falando de uma área que sofre um bocado com a pouca oferta de talentos. E, se considerarmos ainda o envelhecimento da mão de obra (porque, até agora, ninguém conseguiu controlar o tempo - apesar de que Peter Diamandis tenta), vai ser preciso mudar esse mindset pra sobreviver né.